quarta-feira, 11 de abril de 2012

DIÁLOGO SOBRE A FELICIDADE, por Santo Agostinho

Acabei de o ler hoje; aliás, devo confessar que é deveras inspirador ler Santo Agostinho enquanto se estuda piano. É a terceira vez que o faço e também é a terceira vez que tenho um estudo fantástico.
À semelhante de "O Mestre", neste livro, dedicado a Teodoro, Santo Agostinho faz de novo uso do método socrático para chegar ás suas conclusões. Um ponto importante a saber deste livro é que o diálogo aconteceu mesmo e foi registado, aparentemente palavra por palavra. Passo a explicar.
Era dia 13 de Novembro de 386 e era o aniversário de Agostinho. Fazendo uso do argumento de que o alimento da alma era a sabedoria, Agostinho decidiu oferecer um banquete de aniversário diferente: convidou os seus familiares para sua casa e realizou uma tertúlia que se prolongaria até ao dia 15 de Novembro. Os temas eram bastante actuais: "o que é a felicidade?" e "como é que o homem pode ser feliz?". No diálogo participaram o seu irmão Navígio, os seus alunos Trigécio e Licêncio, os seus primos Lartidiano e Rústico, o seu filho Adeodato e, note-se, a sua mãe Mónica; é, de facto, um pormenor interessante ver como uma mulher naquele tempo participou de um diálogo filosófico e acabou por ser, como afirmaram todos, a que melhores conclusões deu e a que mais sabedoria tinha, tanto que Agostinho registou (página 41) "(...) que, esquecidos inteiramente do seu sexo, pensámos que algum grande homem se encontrava sentado connosco..." Contratou-se também um escrivão para registar por escrito todas as palavras que fossem ditas na discussão (página 53) "Eu já tinha dado ordens para que nenhuma palavra que fosse pronunciada ficasse por registar por escrito."
Apesar de ainda achar duvidosas algumas conclusões de Santo Agostinho (uma vez que, por muito impecável que seja o seu raciocínio, parte sempre de premissas já existentes, os dogmas, para suportar as suas conclusões... algo que não está inteiramente de acordo com Sócrates, pois a ideia que tenho do filósofo é que primeiro questionaria os dogmas e depois é que usaria o dogma reformulado/alterado num processo de lógica para chegar a conclusões) devo dizer que é um filósofo (para todos os efeitos, é-o) que me dá gosto de ler. Apesar de o que eu li até agora ser de cunho teocêntrico, a sua capacidade de argumentação (independentemente da utilização de ideias pré-estabelecidas) bem como as temáticas são bastante cativantes e actuais e deita por terra aquela ideia de que a religião não incentiva o raciocínio. Quer se ame ou deteste o homem, creio que é verdade assente de que os seus trabalhos filosóficos são, em muito, a base de muitos ideias filosóficos actuais.

segunda-feira, 9 de abril de 2012

CONTO DE AMOR E PSIQUE, por Apuleio

Este livro não era suposto ter existido... refiro-me na minha prateleira. De facto, já faz um mês que o comprei e dirigia-me eu ao alfarrabista do costume quando, caindo em tentação como sempre em entrar na Fnac, o encontrei na secção de livros de bolsos. Como estava por uma módica quantia (semelhante ao que eu costumo pagar num alfarrabista) decidi aproveitar e levei-o comigo. Adiei o alfarrabista para outra altura...
De facto, este livro (ou parte dele) não se chama propriamente "Conto de Amor e Psique"... na verdade, este conto é um excerto de uma obra maior de Apuleio com onze volumes (!) chamada "O Burro de Ouro" e este conto só entra como narrativa encaixada. A obra (cujos onze volumes se encontram por sua vez agrupados em três secções) é sobre um jovem chamado Lúcio que, depois de tomar certa mezinha, se transforma em burro, vivendo aventuras e desventuras na sua nova forma. O "Conto de Amor e Psique" figura na segunda secção. Sendo Lúcio roubado por uns ladrões e levado para a sua caverna, lá conhece Cárite, uma jovem raptada no momento em que preparava os esposais estando, por isso, inconsolável. Assim, na tentativa de consolá-la e para a entreter, a criada dos ladrões conta-lhe uma história entre o filho de Afrodite e uma mortal.
O "Conto de Amor e Psique" é. decerto, uma história bem conhecida de todos, contudo raras vezes se nota toda a alegoria que existe entre a história e a existência humana. Efectivamente, Eros (que personifica a beleza de corpo) apaixona-se por Psique, uma mortal de beleza equivalente à de Afrodite (que simboliza a beleza de espírito) e que, mesmo sem nunca ter visto a forma física de Eros, apaixona-se à mesma por ele devido às suas atitudes (no fundo, o amor físico aliado o amor platónico ou, por assim dizer, o amor superficial aliado ao amor puro). Ambos têm, no fim, uma filha, à qual puseram o nome de Sensualidade. A união de Eros e Psique (que, casando, se tornam um só), bem como o aparecimento de Sensualidade, acabam por nos dar uma ideia do homem/mulher ideal: a beleza exterior aliada à beleza interior. É uma alegoria bem conseguida e neste conto (e isto é uma questão de gosto) só lhe encontro um defeito no argumento: à semelhança do amor falso e plastificado de Tristão e Isolda (convenhamos, não tem valor nenhum, ambos só se apaixonaram porque beberam uma poção, isso é bruxaria e não amor) também Psique, embora já se encontrando apaixonada por Eros, como dizer, se apaixona ainda mais por ele porque se picou sem querer numa das suas setas... Falo pessoalmente, essa parte tira a graça toda ao ideal que falei anteriormente e era um pormenorzinho que, sendo retirado, não interferiria em nada na história... a não ser que também tenha um simbolismo que me esteja a escapar, caso alguém tenha ideias avise-me, por favor.
Resumindo: quer tenhamos como motivação-base a leitura deste excerto o facto de estarmos apaixonados ou de apenas querermos racionalizar um bocado, o "Conto de Amor e Psique" surge como um documento que exprime o ideal da perfeição na vivência do sentimento comummente conhecido por Amor, podendo ser transportado, a meu ver, para todos os seus desdobramentos, sejam eles amor romântico, platónico, fraterno, sexual, familiar, etc.; porque, se nos dermos conta, em todos se verificar esta constante oposição Eros/Psique que tem a Sensualidade como seu produto. O que os torna diferentes são apenas as variáveis entre os conceitos. Infelizmente as almas são pobres e, com o passo dos anos, a Sensualidade (mesmo enquanto conceito usado no dia-a-dia) acabou por ficar órfã de mãe (Psique) e hoje é unicamente associada ao simbolismo de Eros... Pena...

quarta-feira, 4 de abril de 2012

CONFISSÕES DE UM PECADOR, por Santo Agostinho

Admito. Quando comprei este livro não esperava que fossem apenas excertos, peço desculpa pela desilusão. Seguramente haverá a versão completa, mas esta apareceu-me com um preço módico. Ainda assim, fica aqui a sugestão.
"Confissões de um pecador" é considerada uma das obras mais emblemáticas de Santo Agostinho, junto com a "Cidade de Deus". No início eu estava um pouco renitente a ler este livro, uma vez que não fiquei muito impressionada com a leitura do primeiro livro que li de Santo Agostinho; contudo, cedo afigurou-se-me com uma leitura muito interessante. 
"Confissões de um pecador" é um livro dividido em livros mais pequenos, todos com uma parte específica da sua vida e respectivas temáticas para reflexão. Nele, o próprio Agostinho narra a sua biografia e apresenta a sua experiência de vida, bem como o caminho que o levou à sua conversão, sempre com um tom introspectivo, de reflexão e dedicado a Deus. É uma auto-avaliação partilhada com os demais, esperando que talvez nós nos possamos rever na sua experiência e nas suas falhas.
Compreendo que possam advir alguns sentimentos de desagrado pela leitura deste livro; efectivamente, certos aspectos da mentalidade de Agostinho, ainda que devidamente justificados, podem parecer de difícil compreensão para a maioria dos leitores. Contudo, peço que esqueçam o homem e foquem-se antes do que realmente vos interessa, uma vez que é o seu legado e não o indivíduo que nos importa.